segunda-feira, 24 de agosto de 2009

Minas tem quatro entre as cem melhores cidades para se viver

Janaína Oliveira e
Ana Paula Lima
Repórteres

Quatro entre os cem melhores municípios brasileiros para se viver estão em território mineiro. Puxados principalmente pela ampliação do mercado de trabalho e pelo aumento dos salários, Itabira, Ouro Branco e Belo Horizonte juntaram-se a Nova Lima, que já figurava no ranking elaborado pela Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan). Encabeçam um grupo seleto de cidades cujo Índice Firjan de Desenvolvimento dos Muncípios (IFDM) - uma espécie de Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), medidor de qualidade de vida criado pela Organização das Nações Unidas (ONU) - ultrapassa a nota 0,8, considerada alta.

Para chegar à classificação, a entidade elaborou três sub-índices: Educação (IFDM-E), Saúde (IFDM-S) e Emprego e Renda (IFDM-E & R). No cálculo, levou em conta fatores como qualificação dos professores e evasão escolar, atendimento pré-natal e taxa de mortalidade infantil, e estoque dos empregos formais e evolução dos rendimentos médios. Entre as mineiras, o propulsor para a subida no pódio das “top 100” foi o item que mexe no bolso da população. Com a economia em céu de brigadeiro, numa época de forte demanda por commodities, esses municípios receberam empreendimentos e levaram prosperidade econômica aos seus cidadãos. Vale lembrar que os dados são referentes a 2006.
De 2005 para o ano seguinte, Itabira, onde atua a mineradora Vale, chegou a um IFDM-E & R de 0,9973. Com a proximidade da nota máxima (1,0), assumiu a liderança no quesito no Estado e a vice no país, atrás apenas de Hortolândia, no interior de São Paulo. Hoje, três anos depois, ainda colhe os frutos da boa safra, mas tenta espantar a nebulosidade deixada pela crise financeira internacional, que deu os primeiros sinais em setembro de 2008.
A capital mineira também levou medalha. No Estado, alcançou a 4ª colocação geral, com 0,8417 pontos. Mais uma vez, o que alavancou o desempenho foi a geração de postos de trabalho e o salário mais gordo depositado na conta no início do mês. O rendimento médio dos belo-horizontinos subiu 9,2%, chegando a R$ 1.343. Rafael Moura Silva, 25, nem precisou distribuir currículos. Ele já trabalhava em uma ótica quando foi convidado a mudar de empresa, atraído por um salário melhor. “Como essa área é muito técnica, é difícil achar bons profissionais. Com a nova proposta, passei a ganhar 20% mais”, comemora o jovem, que agora almeja uma promoção.
BH também avançou na área de saúde. Ainda não alcançou o atendimento de 95% das gestantes com seis ou mais consultas de pré-natal, defendido como parâmetro ideal pela Firjan, mas obteve um dos melhores desempenhos do Estado: 69,4%, em 2006. Atendida no Centro de Saúde do Bairro Serra, a dona de casa Cleonice Andrades da Silva, 33 anos, realizou, na última semana, a sexta consulta pré-natal de sua terceira gravidez. E ainda pode ter mais um encontro com o ginecologista. Já Claudiane Pereira não vai completar as seis consultas porque só descobriu a gravidez no terceiro mês, mas nas gestações anteriores fez o acompanhamento. Na capital, a taxa de óbitos com causas mal definidas foi de 7,1% e as mortes evitáveis de crianças com cinco anos ou menos em dez registros a cada mil nascidos vivos.
Na educação, entretanto, a fórmula não foi tão bem-sucedida. O índice para esta área teve um recuo de 0,7705, em 2005, para 0,7534, no ano seguinte. Mas o retrocesso não impediu a capital de subir da 8ª para a 4ª posição entre as sedes dos estados brasileiros. Segundo os dados da Firjan, coletados junto ao Ministério da Educação, o que prejudicou BH foi a queda na taxa de atendimento na Educação Infantil, em creches e pré-escolas das redes municipal, estadual e privada. O percentual de crianças matriculadas teria caído de 34,0% para 28,8%, mas a Prefeitura contesta, alegando que naquele ano ampliou as vagas de 11.071 para 12.409.
A gerente da coordenadoria de Educação Infantil da PBH, Mayrce Terezinha da Silva Freitas, diz que a meta atual é chegar a cem Unidades Municipais de Educação Infantil (Umeis) na capital. Hoje, são 49. A expansão pode significar a chance da auxiliar de serviços gerais Luciene Paiva, 31 anos, ver o filho Matheus, 4, frequentar uma escola gratuita. “No Floramar, não há vagas. Desde o ano passado tento colocar meu filho na Umei, mas ele não foi sorteado”, diz ela.
Em compensação, a capital registra maior qualificação dos professores do Ensino Fundamental. Em 2006, 89,6% deles tinham diploma de curso superior. A tendência é a média aumentar, impulsionada por educadores como Mary Ângela Oliveira, que há três anos voltou para o banco escolar, desta vez na condição de aluna. “Eu só tinha o magistério. Com a faculdade, estarei mais qualificada para lecionar”.
No geral, o resultado deixou BH atrás somente de Vitória, São Paulo e Curitiba – capitais com IFDM de 0,8642, 0,8568 e 0,8546, respectivamente. Com relação aos estados, Minas saiu dos 0,7793, em 2005, para os 0,7911 pontos, em 2006, um incremento de 3,2%, apesar de permanecer como a quinta federação mais desenvolvida do país. Novamente, destaque para emprego e renda, cuja nota foi 0,8696. Já na vertente educação, o Estado recuou de 0,7257 para 0,7232, mesmo tendo subido da 7ª para a 5ª posição no ranking que avalia crianças na sala de aula e profissionalização dos professores. Os piores resultados estão nas regiões mais pobres: Norte, Jequitinhonha e Mucuri. Já os melhores ficaram no Sul, Centro e Triângulo.
Os dados da Firjan não surpreenderam a subsecretária de Indústria, Comércio e Serviços da Secretaria Estadual de Desenvolvimento Econômico, Marilena Chaves. “Os indicadores se parecem muito com os resultados do IDH e mostram uma disparidade regional já conhecida”, diz, acrescentando que ações do Governo poderão amenizar as desigualdades. (Colaborou Renata Galdino)i


Município do Norte de Minas tem o pior desempenho no quesito saúde

Ana Paula Lima e
Girleno Alencar
Repórter
e da Sucursal de Montes Claros

BELO HORIZONTE E SÃO JOÃO DO PACUÍ - O dia não sai da memória do lavrador Genivaldo Cardoso da Silva. Em 20 de abril de 2007, ele perdeu o primogênito, um bebê de apenas três dias. Jean Júnior Lopes Cardoso morreu nos braços da mãe, Sueli Soares Lopes, depois de chegar à policlínica municipal com febre e, nas palavras da mãe, “uma baba saindo da boca”. Um jato de remédio aerosol e duas gotas de outro medicamento, administradas na unidade saúde, foram incapazes de salvar a criança.

Jean não entrou para as estatísticas oficiais de São João do Pacuí - já que os pais afirmam não ter, até hoje, recebido esclarecimentos sobre a morte ou o atestado de óbito do menino. O bebê acabou sepultado à revelia dos trâmites legais e, por isso, é pouco provável que tenha tido o nome incluído nos registros de mortalidade infantil do Governo do Estado e do Ministério da Saúde.
Mas o garoto ilustra a realidade do município que, de acordo com levantamento da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan), teve o pior desempenho em saúde entre as 853 cidades de Minas. Em São João do Pacuí, o Índice Firjan de Desenvolvimento Municipal na área (IFDM-S), em 2006, foi de apenas 0,3608. O indicador varia de 0 (pior) a 1 (melhor). Notas entre 0 e 4 classificam o desempenho como baixo.
O resultado é a soma de três indicadores aferidos pela Firjan a partir de dados do Ministério da Saúde. Segundo a pesquisa, apenas 49,3% das mulheres grávidas do município fizeram seis ou mais consultas de pré-natal, naquele ano. A taxa ideal, conforme os pesquisadores, seria de pelo menos 95%. Os exames ajudam a identificar alterações para a mãe e o feto, abrindo caminho para que riscos para a mulher e o filho sejam minimizados.
São João do Pacuí ainda teria registrado um percentual expressivo de mortes por causas mal definidas (47,2%) - que podem significar assistência médica insuficiente ou precária - e um alto índice de óbitos de crianças menores de cinco anos por causas evitáveis. Conforme os dados, o número de mortes, nessa faixa etária, seria de 95,2 para cada mil nascidos vivos, em 2006. Significa que, de cada dez bebês que vieram ao mundo naquela localidade, um teria falecido antes de completar cinco anos.
Os dados, associados ao baixo nível de emprego e renda no município (0,2222), e à fraca avaliação em educação (0,5171, que o deixa como o 18º mais mal colocado nesta área em Minas) fazem São João do Pacuí amargar a pior posição em desenvolvimento no Estado, segundo os critérios da pesquisa.
Mas a Prefeitura contesta os dados. Alega que houve erro na divulgação das estatísticas de saúde, e que já providenciou a correção dos relatórios com as informações. O levantamento dos dados é feito pelo próprio município, que repassa o material à Gerência Regional de Saúde (GRS). O ministério usa a mesma fonte. A GRS de Montes Claros informou que, se há divergência entre dados oficiais e a realidade dos município, a falha parte do gestor municipal. A correção é possível, mas somente após o reenvio de todo o relatório.
O prefeito João Antônio Ribeiro (PTB) afirma ainda que, nos últimos seis anos, apenas duas crianças teriam morrido - nenhuma em 2006. Hoje, São João do Pacuí tem 3.700 habitantes e uma equipe do Programa de Saúde da Família. A Prefeitura vai colocar mais uma em funcionamento.
No Sudeste, piores estão em Minas
Mas São João do Pacuí não está sozinha no mau desempenho em saúde, apontado pelo levantamento da Firjan. Dos 300 municípios brasileiros com pior resultado na área, 28 estão no Sudeste do país. E todos são mineiros. A lista tem sete cidades do Norte do Estado, sete do Vale do Jequitinhonha e mais sete do Mucuri - não por acaso, as regiões mais pobres de Minas. Cinco municípios ficam no Rio Doce e somente dois na parte mais central do território mineiro.
O indicador ruim ajudou a colocar Bonito de Minas e Santa Cruz de Salinas, ambos no Norte, entre as localidades mineiras com pior IFDM geral. Já Catuji, no Vale do Mucuri, escapou da lista dos piores, mas figura no grupo dos municípios que deixaram a desejar também em educação - neste quesito, foi o terceiro mais mal colocado, em MG.
Já os cinco municípios com os melhores resultados ficam no Alto Paranaíba e no Sul de Minas - na última região, estão as cidades classificadas em 2º, 3º, 4º e 5º lugares. Todas tiveram média em Saúde acima de 0,9. A localidade campeã, Santa Juliana, alcançou 0,9552.
A concentração de municípios com boa performance em áreas prósperas de Minas, e daqueles com atendimento mais precário no Norte, Jequitinhonha e Mucuri não é um simples capricho geográfico. A subsecretária de Políticas e Ações de Saúde do Governo do Estado, Helidéa de Oliveira Lima, explica que o desempenho é diretamente afetado pelas condições econômicas e sociais da região onde as cidades estão.
“É claro que a gestão municipal faz diferença, e a disponibilidade dos serviços em saúde também. Mas há outros fatores condicionantes. Nas regiões mais pobres, as taxas de fecundidade e analfabetismo são maiores. O saneamento básico é precário e a renda domiciliar, mais baixa. Tudo isso interfere e faz com que as pessoas adoeçam mais, em relação aos moradores de áreas mais desenvolvidas”, afirma Helidéa.
Para uma professora de gestão em saúde pública, que preferiu não ser identificada por não conhecer a pesquisa na íntegra, também é preciso considerar, na avaliação, a dificuldade para contratar profissionais de saúde em áreas carentes do Estado e particularidades dos municípios, como o número de habitantes e a população rural.
“Quanto maior a faixa de habitantes que vive na zona rural, mais complicado é organizar o sistema de saúde. As famílias são dispersas, vivem em pontos distantes e não é fácil, por exemplo, garantir que as gestantes vão comparecer às consultas de pré-natal”, diz a especialista, que também atua na área de sistemas de informação em saúde.
É esse o argumento usado pelo secretário de Saúde de Alvorada de Minas (Central), Danílio Cléssio Ferreira, para justificar os fracos indicadores do município - entre eles, somente 16,3% das gestantes fazendo seis ou mais consultas médicas durante a gravidez. “Dos 3.300 habitantes, 70% estão no campo, sobrevivendo basicamente da agricultura e pecuária familiares. “São famílias carentes, e nosso maior desafio é diminuir a taxa de crianças desnutridas e com baixo peso, que supera os 15%”. Em 2006, a Prefeitura estava sob outra gestão.
Segundo Danílio, as mortes de menores de cinco anos sofreram queda, neste ano, pela assistência regular de enfermeiras e médicos do PSF, mas os números ainda não foram apurados. Já a ação de agentes de saúde no campo teria permitido maior acesso das grávidas ao pré-natal.
Em Santa Helena de Minas (Mucuri), o secretário Raul da Silva Neto atribuiu os baixos indicadores em saúde principalmente à dificuldade de atuação em uma tribo de índios maxacalis, que agrega 730 dos 6 mil moradores. Ele afirma que uma equipe do PSF foi designada para ir à aldeia todos os dias. A medida pode reduzir, no futuro, os números ruins. “Nossa meta é reduzir a mortalidade infantil pela metade, até o fim de 2010”. Já o reduzido atendimento no pré-natal seria resultado da subnotificação de consultas feitas pelas grávidas em municípios vizinhos, mas a situação estaria sendo regularizada.
Em Monte Formoso (Jequitinhonha), o secretário José Valdir Gomes Luiz acredita que a criação de um serviço de atendimento à mulher, feita em 2009, vai melhorar o alcance do pré-natal, e a realização de diagnósticos de anemia no próprio município, desde o início do ano, pode evitar complicações em crianças e reduzir a mortalidade.
Desafios que não fazem parte da realidade dos moradores de Itamonte, no Sul do Estado. Lá, 88,3% das mulheres que esperavam bebês foram avaliadas por médicos pelo menos seis vezes durante a gestação, em 2006. No ano passado, afirma o secretário de Saúde, Antônio Giovani Américo, o atendimento chegou a 163 das 168 grávidas da cidade - 97% do total, índice superior aos 95% defendidos pela Firjan . Em 2009, uma das beneficiadas é Juliana Ferraz, 28 anos. Ela terá um bebê em setembro e, na próxima semana, fará a oitava consulta de pré-natal. Já em Muzambinho, que teve IFDM-S de 0,9407, a Prefeitura aposta na criação de equipes do PSF como forma de melhorar os índices. A cidade tem três grupos e pretende chegar a nove. (Com Margarida Hallacoc).